Colaboração: Greice De Vit Monti
Top Fotógrafos unem-se por melhores condições de trabalho
Editorial de Fabio Bartelt para a revista “Elle” Brasil ©Fabio Bartelt/Reprodução No dia 04.05 as editoras das principais revistas de moda brasileiras receberam um email do fotógrafo Bob Wolfenson, que há 20 anos está entre os mais cobiçados pelas publicações.
A mensagem avisa sobre uma nova tabela de preços organizada por um grupo de fotógrafos com o objetivo de “rever os preços pagos aos editoriais de moda, congelados há muito tempo”. O texto também lembra que os fotógrafos tiveram que se adequar a fotografia digital, o que resulta em grandes investimentos em equipamento. A cada semestre aparece uma câmera, um computador e um jogo de lentes sempre superiores aos do ano passado.
Pensando nisso, Bob reuniu um grupo de fotógrafos que inclui outros nomes importantes, como Fabio Bartelt, Gui Paganini, André Schiliró, Henrique Gendre, Mauricio Nahas e Jacques Dequeker, para criar e formalizar essa nova planilha de custos que deve vigorar a partir do dia 01.06. “Precisamos ordenar os editoriais de uma maneira que não fique tão indigente. Faz dez anos que as revistas trabalham com os mesmos valores”, diz Wolfenson ao FFW.
Até agora Bob sabe que o assunto repercutiu nas redações, mas ele não recebeu nenhuma resposta ou telefonema por parte das editoras. “Essa iniciativa deveria ter partido dos próprios veículos”, diz. “Se você vai abrir uma revista hoje tem que pensar que tem que ter cachê pro fotógrafo, tem que ter dinheiro pra produção…”.
Editorial de Henrique Gendre para a revista “Vogue” Brasil ©Henrique Gendre/Reprodução Outra reclamação cada vez mais comum entre os fotógrafos brasileiros é o fato de que as principais revistas de moda, que carregam títulos internacionais, estão em guerra declarada pela edição mais especial e exclusiva, mês a mês. E nessa busca, vão atrás de modelos, fotógrafos e stylists estrangeiros para suas capas. “O cara vem pra cá e não traz nem a câmera dele. Tudo é alugado aqui, eles pedem várias exigências e as revistas aceitam”, conta Bob.
Para Kika Brandão, editora de moda da revista “Alfa”, que integra o portfolio da editora Abril, esse email é um bom sinal. “Fiquei surpresa de perceber que a classe está unida. Tem revistas que pagam muito pouco mesmo e ainda não oferecem estrutura”, diz. “Esse tipo de ação pode qualificar e padronizar o relacionamento desses profissionais com as publicações”.
Para Kika, ainda não é isso o que ocorre. Segundo a editora, a “Alfa” paga aos fotógrafos R$ 2 mil para um ensaio de oito páginas, de fato um valor considerado bom dentro do mercado editorial. Mas isso ainda não parece suficiente na hora de conseguir um profissional renomado, mesmo que a revista tenha uma tiragem de 120 mil a 140 mil exemplares por mês, como é o caso da “Alfa”. “Não existe o interesse por não se tratar de um título internacional”, reclama. “Nossos ensaios são sempre com atrizes de primeiro time, como Camila Pitanga, e eu preciso trabalhar com gente bacana, até mesmo para atender as demandas das próprias atrizes. O que me deixa triste é essa falta de interesse”.
Daniela Falcão, diretora de redação da “Vogue”, também acha a iniciativa válida. “Sobretudo porque acredito que diálogo é sempre bom, e é louvável que os fotógrafos estejam dialogando entre si. Quanto às reivindicações, estamos também dialogando com nossos fotógrafos, para atender da melhor maneira possível as necessidades de cada um. Porque eles trabalham em condições diferentes, estão em momentos diferentes de carreira e de vida, têm aspirações diferentes. Logo, o mais importante para um, não necessariamente é tão importante assim para o outro”.
Com uma tabela padronizando os valores, os fotógrafos ganham na luta por mais direitos e as revistas também têm que melhorar o serviço oferecido. “Isso só vai funcionar se essa tabela for mesmo para todas as revistas. Não adianta ele cobrar pouco de um título internacional, chegar na minha revista e cobrar mais. Isso deve quebrar um pouco a panelinha da moda porque as revistas que não tiverem orçamento vão precisar buscar outros fotógrafos”.
E se isso de fato acontecer, muitos fotógrafos sem espaço no mercado, mas com talento, dedicação e bom gosto, podem começar a trabalhar mais, aprender com essa experiência e se tornar capazes de atender publicações de primeiro nível, abrindo assim o mercado de trabalho na moda. “Faltam revistas que apostem em novos talentos e que deem espaço para quem nunca foi assistente do Bob, do Gui ou do Duran”, diz Kika.
Editorial de Bob Wolfenson para a revista “Alfa” ©Bob Wolfenson/Reprodução Fotógrafos unidos jamais serão vencidos. Mas e o restante da equipe? Quem joga a pergunta é o stylist Thiago Ferraz. “Trabalhamos tanto quanto e continuamos ganhando o mesmo? As revistas nos dão exposição criativa, mas em troca disso precisamos viver esse perrengue eterno?”, questiona.
Por perrengue eterno, leia-se uma verba que pode ir de R$ 150 a R$ 1.000 por trabalho, dependendo do projeto e da publicação; falta de carro para produção e de verba de alimentação. Fotógrafos, stylists e maquiadores ainda têm que dar um cachê para seus assistentes. “Muitas vezes nós pagamos para fazer um editorial”, diz.
Vale observar que não são todas as revistas que se comportam assim. Existem de fato publicações mais independentes e com poucos recursos e também revistas importantes que mantém uma conduta correta de remuneração.
O que o stylist pede é um mercado mais equilibrado. “Somos parte de um sistema que deve ser padronizado. Cada um tem uma opinião, mas estão todos debaixo do mesmo guarda-chuva. Falar que não tem dinheiro é mentira, pois o mercado de moda está claramente evoluindo, com muitos anunciantes gringos e o editorial precisa acompanhar essa evolução”.
Em uma mensagem postada no Facebook para Thiago, Bob Wolfenson sugere: “Não estamos reivindicando uma inserção do país no mundo? Proponho que cada setor se organize. Acho que de fato o país mudou, o mercado mudou, chegaram grandes corporações e nós continuamos na mesma indigência no setor de revistas. O nosso clamor é por mudanças”.
O que dá para tirar dessa discussão é que, de fato, o mercado de moda, inclusive o editorial, está mudando, o interesse pelo Brasil está aumentando da mesma forma que os investimentos. O fotógrafo, o stylist, o maquiador e a modelo, só para citar a equipe de frente envolvida em um ensaio, são responsáveis por fazer a gente acreditar no sonho da moda, a criar desejo e adoração no consumidor e também a manter nos leitores a expectativa da chegada das revistas nas bancas. Imagem, em uma publicação de moda, é tudo. Nada mais natural que eles sejam levados em conta neste momento de mudanças. “Amor pela moda, a gente tem pra dar. E tem de sobra”, diz Thiago Ferraz. Mas só amor não paga as contas.
+ Leia abaixo a carta na íntegra criada por um grupo de fotógrafos e enviada para as redações de revistas de moda:
Às Editoras e afins,
Nós, fotógrafos aqui reunidos decidimos por unanimidade rever os preços pagos aos editorias de moda congelados há muito tempo. Apesar dos reajustes feitos por alguns veículos, sentimos que estamos muito defasados em relação aos aumentos concedidos, em qualquer setor, nestes últimos anos.
Sem contar que ao passarmos do sistema análogico para o digital houve um investimento muito grande de nossa parte em equipamentos e adequações. Além disso, o que era custo para as revistas como filmes, polaroids, revelações e ampliações, evaporou-se e virou receita das próprias.
O que começaremos a praticar a partir de 1º de Junho, sem exceções, é uma nova tabela de preços mínimos. Acima disso as negociações serão feitas entre as partes.
Aqui segue a tabela:
- Editoriais de moda: R$ 300,00 por página.
- Retratos ou algo que ocupe apenas uma página: R$ 1000,00.
- Capa da revista: R$1500,00.
- Equipamento de luz- do própro fotógrafo posto em uso: R$ 800,00.
- Estúdio: R$ 800,00 a diária.