O autorretrato do inventor |
Diploma da Maçonaria,
primeiro registro fotográfico oficial de Hércules Florence, de 1832.A fotografia é, sem dúvida, uma das grandes invenções do século XIX que revolucionaram as formas de criar e consumir a arte. A primeira fotografia data de 1826, pelas mão dos francês Joseph Nicéphore Niépce, que cunhou a técnica de heliografia. Contudo, ao longo dos anos, atribuiu-se a criação da mesma pelas mãos de diversos homens em diferentes locais do mundo. A fotografia não é a invenção de um homem só. Em 1835, Louis Jacques Mandé Daguerre, também francês, prosseguiu os experimentos de Niépce, levando-o a descoberta decisiva da primeira imagem fixa pela ação direta da luz. Já na Inglaterra, William Fox Talbot evoluiu ainda mais na descoberta utilizando-se de papéis fotossensíveis com reagentes químicos para produzir uma imagem positiva.Praticamente na mesma época, no Brasil, o francês aqui radicado conhecido como Hércules Florence, desenvolvia técnicas avançadas que o fizeram conseguir resultados superiores à Daguerre. Florence, no entanto, por estar consideravelmente afastado da Europa, só obteve reconhecimento por seu invento criado em 1832 mais de um século e meio depois, em 1976, através de esforços do fotógrafo e historiador brasileiro Boris Kossoy. Através de registros em seu diário em 1834 comprova-se que Hércules Florence foi o primeiro homem a cunhar o termo photographie.Nascido Antoine Hercule Romuald Florence em 1804 em Nice, na França, o inventor veio a fixar residência no Brasil com apenas 20 anos, mais precisamente na cidade de Campinas, no interior de São Paulo. Florence trabalhou por um tempo como caixeiro e logo em seguida foi trabalhar em uma livraria e tipografia, onde pode desenvolver seus talentos natos de desenhista. Por ser um exímio artista desde a infância, ele acabou por juntar-se a uma expedição para o interior do Brasil, inclusive passando pela Amazônia, para ocupar-se dos registros visuais da viagem. A expedição comandada pelo naturalista alemão Georg Heinrich von Langsdorff teve papel decisivo na descoberta da fotografia por Hércules Florence, que de 1825 a 1829 registrou incansavelmente e com grande precisão nos detalhes, a natureza e os habitantes dos então confins do Brasil.Na imagem abaixo é possível perceber tal apreço pela minúcia que eventualmente impulsionou Florence a buscar novas formas de registro, além de colocá-lo, ao lado de Aimé-Adrien Taunay, que o acompanhou na expedição, como pioneiros da geografia e história brasileira.
MAIS FLORENCE...
Biografia
Desde pequeno Hércules Florence demonstrou possuir notável talento para o desenho. Ao ler Robson Crusoé, de Daniel Defoe, apaixonou-se pela vida no mar. Em 1820, com apenas 16 anos, tornou-se grumete. Esteve em Mônaco, na Holanda e na Bélgica. Em 1824 chegou ao Brasil a bordo da fragata Maria Thereza, aportando no Rio de Janeiro. A fragata ficou estacionada um mês e seguiu seu trajeto, porém sem o jovem Florence, que se fixaria no Brasil por toda a vida. Obteve emprego, inicialmente, como caixeiro numa casa de roupas, transferindo-se, logo a seguir, para o estabelecimento de outro francês, Pierre Plancher, proprietário de uma livraria e uma tipografia.
A Expedição Langsdorff
Um ano depois, Florence ficou fascinado com a perspectiva de realizar uma viagem pelo interior do Brasil. Sua grande aventura teve início quando foi informado de que um naturalista alemão, o Barão Georg Heinrich von Langsdorff, pretendia empreender uma expedição científica por várias províncias do país, incluindo a Amazônia, e necessitava de um desenhista. Florence conseguiu ser admitido no cargo pelo seu talento artístico e pelos seus conhecimentos de cartografia. Juntamente com Aimé-Adrien Taunay completou a dupla de desenhistas incumbida de realizar a documentação iconográfica ao longo do extenso trajeto da expedição. Deve-se a Florence o relato completo dessa aventura, percorrida ao longo de 13.000 quilômetros entre os anos de 1825 a 1829, assim como a maior parte da documentação iconográfica. Nela se percebe sua preocupação em registrar com rigor científico a natureza e os índios das regiões visitadas. Essa coleção de imagens é de valor inestimável para os estudos antropológicos e etnográficos, conforme é atestado por cientistas brasileiros e estrangeiros.Após seu retorno da expedição, contraiu núpcias com Maria Angélica A. M. Vasconcelos, filha de importante político paulista, fixando residência na pacata vila de São Carlos(Campinas).
Primeiras invenções:
a Zoofonia, a Poligrafia e a Fotografia
Pretendendo publicar um estudo que fizera sobre os sons emitidos pelos animais, produto de suas observações anotadas na selva durante a expedição (o qual intitulou "zoophonie"), deparou com a inexistência de oficinas impressoras na Província de São Paulo. Decidiu então idear seu próprio método de impressão, a Poligraphie, e em 1832, já se encontrava estabelecido comercialmente oferecendo ao público seus escritos e desenhos, além de manter, ao mesmo tempo, uma loja de tecidos. Observando o descolorimento que sofriam os tecidos de indianas expostos à luz do sol e informado pelo jovem boticário (e futuro botânico de nomeada) Joaquim Correia de Melo das propriedades do nitrato de prata, deu início às suas investigações sobre fotografia. Suas primeiras experiências com a câmera obscura datam de janeiro de 1833 e encontram-se registradas no manuscrito Livre d'Annotations et de Premier Matériaux. Mais de 150 anos depois, o exame detalhado desse manuscrito por Boris Kossoy levou-o a comprovar o emprego pioneiro de Florence da palavra "photographie", pelo menos cinco anos antes que o vocábulo fosse utilizado pela primeira vez na Europa.
Outras atividades e invenções
Florence foi ainda pioneiro da imprensa em Campinas ao fundar, em 1836, O Paulista, primeiro jornal do interior da Província de São Paulo. A proliferação em Campinas de bilhetes falsos de banco induziu-o a inventar um novo método de impressão para evitar falsificações, sobre o que publicou um folheto de 14 páginas. Em 1843 a Academia de Ciências e Artes deTurim declarou que o seu invento tinha algo de novo, com propriedades contrabalançadas com defeitos, mas que merecia a proteção do Governo de Sardenha.Em 1847, Florence descreveu o emprego dos "Typo-sílabas", ideia precursora da taquigrafia.Florence enviuvou em 17 de janeiro de 1850, mas quatro anos depois casou-se novamente, desta vez com Carolina Krug, de origem alemã, com a qual teve sete filhos. O casamento ocorreu em 4 de janeiro de 1854. Florence já contava então 50 anos.Em 1860 inventou a "pulvografia", a impressão por meio do pó. Em 1877 foi eleito membro do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo. No fim da sua vida, dedicava-se à agricultura.
Obras
FLORENCE, Antoine Hercule Romuald. Ensaio sobre a impressão das notas de banco por um processo totalmente inimitável, precedido por algumas observações sobre a gravura das mesmas notas, e o modo de se conhecer as que são falsas. Campinas: Tipografia de Costa Silveira, 1841.
FLORENCE, Antoine Hercule Romuald. Zoophonia. Revista Trimensal do Instituto Histórico Geographico e Ethnographico do Brasil. Rio de Janeiro: B.L. Garnier, tomo XXXIX, parte segunda, 1876, p. 321-336.
FLORENCE, Antoine Hercule Romuald. Viagem fluvial do Tietê ao Amazonas de 1825 a 1829 São Paulo: Editora Cultrix, 1977.
Bibliografia
- BOURROUL, Leão Estevão. Hércules Florence. São Paulo: Tipografia Andrade Mello & Comp., 1900.
- FONSECA, Dayz Peixoto. O Viajante Hércules Forence: águas, guanás e guaranás. Campinas (SP): Pontes, 2008.
- KOSSOY, Boris. Hercules Florence - 1833 - a descoberta isolada da fotografia no Brasil (2ª ed.). São Paulo: Duas Cidades, 1980.
- KOSSOY, Boris. Fotografia e História, São Paulo: Ateliê Editorial, 2003. ISBN 85-7480-060-0
- MONTEIRO, Rosana Horio. Descobertas múltiplas – A fotografia no Brasil (1824 – 1833). São Paulo: FAPESP, 2001.
- Expedição Langsdorff ao Brasil, Iconografia da Academia de Ciências da União Soviética. Rio de Janeiro, Alumbramento, 1988, 3 vols.
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